quinta-feira, outubro 19, 2006

Tempo


29 de dezembro de 2004.

Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ANO, foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos.
Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui por diante vai ser diferente.

Carlos Drummond

"Que é um pai, afinal?"


28 de dezembro de 2004.

Outro texto sobre o mesmo tema (também recebido de Ricardo I.)

Erma Bombeck

"Aconteceu uma coisa incrível quando a gente se divorciou. Conhecem o gênero, o pai que não ficou com os filhos, que não parava muito em casa, mas também quem é que sentia a falta dele? As crianças sentiam. Por que razão? Ele não ajudou a mulher a fazer respiração quando o filho nasceu. Estava lá fora na sala de espera, fumando um cigarro com um cara que vendia imóveis. Nunca sabia onde é que estavam as fraldas e quando punha o bebê para arrotar parecia que tinha um tijolo na mão. Quando as crianças se sentavam na beira da calçada à espera que ele chegasse do trabalho, limitava-se a passar-lhes a mão pelo cabelo e a dizer: "Como é que é, bicho?" Era assim.
Sempre que um filho chorava, sabem o que é que ele fazia? Gritava para a mãe: "Tem algum grilo. Ele está atrás de você." Nunca lhe passou pela cabeça que a criança estava a fim era dele mesmo. De vez em quando, parecia querer beijar os filhos, especialmente quando se machucavam ou ao deitar, mas acabava se retraindo. Muitas vezes dava a sensação de que não se achava importante... mas que era apenas alguém por quem se esperava até chegar em casa para que ele pudesse passar uns tremendos carões nos filhos.
Como mãe, pergunto a mim mesma qual será essa qualidade mágica, indefinível, que os filhos vêem nos pais. Será a força das mãos que eles acreditam que nunca os deixarão cair quando os atiram no ar? Será a calma que ele traz a um confronto impetuoso quando pergunta aos filhos o que pensam antes de fazer um julgamento? Talvez eles consigam enxergar o medo que está bem lá no fundo, que nunca vem à superfície, ou a lágrima que está lá, mas nunca é derramada, ou talvez o amor que raramente é acompanhado de palavras.

Sinceramente, não compreendo. Como mães, ensinam-nos que o amor e o respeito têm de ser merecidos. Eu sei que o que os pais não fazem, mas que fazem eles para merecer esse respeito e amor? Sem passar a ferro uma camisa, fazer um bolo de aniversário ou ler uma história, eles ocupam um lugar alto na existência de um filho. Será possível que as crianças tenham a sensação de um ser humano único que esteve presente no início e que estará até o fim e que não será uma mãe - mas que cumprirá essa função rara que é a de pai? Não compreendo. Mas as crianças sim.

Pai


28 de dezembro de 2004.

Texto de Fabio Hernandez (recebido de Ricardo I.)

A mulher pode implicar com qualquer coisa. Com nossos amigos. Com nosso carro. Com nosso cachorro. Com nossa mania de discutir futebol como se fosse uma coisa realmente séria. Até com nossa mãe - que na verdade sempre acha, quase nunca com razão, que somos muito melhores que aquela mulherzinha que lhe impingimos como nora. A mulher pode implicar com tudo que quiser. Exceto uma coisa: o pai.
A pior coisa que uma mulher pode fazer pelo romance é implicar com o pai do namorado, marido ou o que seja. Porque o pai é a figura central na vida de um homem. O pai é nosso modelo desde o berço até o caixão. Nós passamos a vida inteira querendo fazer bonito para as mulheres. (Me lembro do tombo espetacular de bicicleta que meu irmão Ed levou aos oito anos na tentativa de impressionar a Fernanda. Duro mesmo foi levantar-se do chão, não chorar de dor e, com o resto de dignidade que sobrava, subir de novo na bicicleta e voltar para casa, onde minha mãe lhe deu um banho que lhe arrancou gritos assustadores.)
Mas eu dizia o seguinte antes de ser interrompido por mim mesmo e minhas divagações pretéritas. Nós passamos a vida inteira querendo impressionar as mulheres. Mas o julgamento de nenhuma mulher, por mais amada que seja, tem para nós o mesmo impacto do julgamento de nosso pai. A reprovação paterna é cruel como um velho cossaco russo. (Meu Tio Fabio, um homem sábio do interior, é quem dizia que os velhos cossacos russos eram cruéis. Nunca chequei, mas confio em meu tio e então acredito na crueldade cossaca. ) E poucas coisas se igualam, em toda nossa vida, à aprovação paterna. A maior platéia de um homem é composta de uma só pessoa: seu pai.
Um amigo meu jogava futebol. Futebol sério. Não essas peladas de cervejeiros nos finais de semana. Batia de canhota. Jogou em estádios cheios, com torcida fazendo batucada. Ele me disse uma vez que, durante os jogos, sempre olhava para as arquibancadas à procura de seu pai. Importava menos a opinião de seu técnico do que a de seu pai. Cada grande jogada que ele fazia pensava no pai. E quando perdeu um gol decisivo ele ficou arrasado porque sentiu que decepcionara seu pai. Sempre entendi esse meu amigo perfeitamente.

Numa certa época da vida, na adolescência, gostamos de contestar o pai. Mas é uma contestação de mentirinha. Somos, na adolescência, idiotas sem juízo, ignorantes presunçosos. Mas esse estado de torpor intelectual não dura uma vida inteira. Envelhecemos, graças a Deus. E logo aprendemos que nosso pai estava quase sempre certo nos reparos que fazia em nossa adolescência. Matamos o pai, adolescentes, para ressuscitá-lo, ainda mais forte, na idade da razão.
E então digo a todas as mulheres do mundo interessadas num bom relacionamento amoroso: não mexam com o pai dele. Se não bastassem todas as razões que alinhei, haveria ainda uma outra. O nosso pai, ao contrário da nossa mãe, é quase sempre aliado da namorada. Porque ele tem esperança de que ela possa trazer juízo para o filho. Possa transformar o garoto num homem. No mais das vezes, é - para citar uma frase fabulosa de La Rochefoucauld - o triunfo da esperança sobre a experiência.
E agora a parte triste. (Quem quer coisas alegres mude agora, por favor, de página.) A morte do pai atira o homem num persistente estado de desamparo do qual ele leva anos, décadas para se livrar. Às vezes, nunca se livra. Pai morto. E então me ocorre a idéia de uma onda. Para enfrentá-la é preciso bater os braços, bater os braços e bater os braços. Para onde as braçadas levam? Francamente, não sei, mas o que importa? O que importa é bater os braços, bater os braços e ainda bater os braços.

Abaixo o uniforme?


2 de outubro de 2004.

Fantasias existem muitas. Com enfermeira, com aeromoça, com policial feminino. Com a moça de uniforme. Cada homem tem a sua e muitos nem tem. Eu, particularmente, não tenho. Eu acho. Enquanto escrevo penso numa enfermeira. É, talvez, eu tenha...
As mulheres também têm as suas. Policial, bombeiro, oficial da marinha, exército ou aeronáutica.
Festa de final de ano. Confraternização de funcionários de qualquer empresa. A moça chega em seus trajes normais ou mais produzidos. Atrai olhares. Muitos olhares. Desperta pensamentos e até alguns comentários do tipo “que diferença!” ou “eu nunca tinha notado que é tudo isso”.
Lanchonete ou restaurante. Garçonete ou recepcionista. Já viu a moça sem uniforme? Ao chegar ou ao sair? Tem sempre a que surpreende. Outro dia vi uma belíssima bunda que a calça do uniforme escondia. Esta semana cruzei com outra num elevador, fora do horário de expediente: quase não reconheci.
Abaixo o uniforme? Na maioria dos casos sim. Vale a pena. Em outros nunca! E as fantasias, onde ficarão? Acima as mulheres!

Muito menos lipo-as e muito mais piração


26 de agosto de 2004.

Texto que recebi hoje por e-mail. Fazia tempo que não visitava esse meu pedaço...

Vaidade

Cantor do LS Jack é internado em coma no Rio após lipoaspiração.


É possível isso? É admissível isso? Um rapaz de 27 anos ter uma parada cardíaca e entrar em coma após uma cirurgia de lipoaspiração?
Pelo amor de Deus, eu não quero usar nada nem ninguém, nem falar do que não sei, nem procurar culpados, nem acusar ou apontar pessoas, mas ninguém está percebendo que toda essa busca insana pela estética ideal é muito menos lipo-as e muito mais piração? Uma coisa é saúde outra é obsessão. O mundo pirou, enlouqueceu.
Hoje, Deus é a auto-imagem. Religião, é dieta. Fé, só na estética. Ritual é malhação. Amor é cafona, sinceridade é careta, pudor é ridículo, sentimento é bobagem. Gordura é pecado mortal. Ruga é contravenção. Roubar pode, envelhecer, não. Estria é caso de polícia. Celulite é falta de educação. Filho da puta bem sucedido é exemplo de sucesso. A máxima moderna. Moderna é uma só: pagando bem, que mal tem? A sociedade consumidora, a que tem dinheiro, a que produz, não pensa em mais nada além da imagem, imagem, imagem. Imagem, estética, medidas, beleza. Nada mais importa. Não importam os sentimentos, não importa a cultura, a sabedoria, o relacionamento, a amizade, a ajuda, nada mais importa. Não importa o outro, a volta, o coletivo. Jovens não têm mais fé, nem idealismo, nem posição política.
Adultos perdem o senso em busca da juventude fabricada. Ok, eu também quero me sentir bem, quero caber nas roupas, quero ficar legal, quero caminhar, correr, viver muito, ter uma aparência legal mas... uma sociedade de adolescentes anoréxicas e bulímicas, de jovens lipoaspiradas, turbinadas, aos vinte anos não é normal. Não é, não pode ser.
Deus permita que ele volte do coma sem seqüelas. Que as pessoas discutam o assunto. Que alguém acorde. Que o mundo mude. Que eu me acalme. Que o amor sobreviva.
"Cuide bem do seu amor, seja quem for."

Herbert Vianna

Aniversários


10 de abril de 2004.

Hoje é meu aniversário. Mais um. Hoje também faço aniversário com a Clau: 2 anos. Outra data que lembro no dia de hoje: 12 anos em que o Sylas mexeu-se pela primeira vez na barriga da mãe. Eles (meus filhos) estão fora, na praia.
Ontem completou-se 12 anos da morte do Renato. Lembrei-me. Aliás, foi no seu enterro que o Sylas se mexeu. Por pouco não se chamou Renato, mesmo nome do meu primo querido.

São Paulo está lenta. O feriado levou muita gente embora. O volume da cidade é menor, mais tranqüilo.

Levantei meio triste pelo desentendimento com a Clau ontem. Mas passa. Hoje quando nos falamos pelo telefone a voz dela já era outra. Que bom!

Eu iria escrever outras coisas que estava pensando pela manhã. Mas já esqueci.

Coloquei no meu desktop hoje uma foto que meu pai enviou: eu, Haroldo Luís, meu irmão, e Gustavo Barbosa. Velha foto... Bons tempos. Daqueles quando eu ainda era virgem, como no texto do Fabio Hernandez...

Fica isso então...

ENTÃO, CANCELA!


1º de abril de 2004.
Recebi esse texto do Cadú em 19 de fevereiro p.p.. Mário Prata será sempre Mário Prata!

(Mário Prata)

CASO 1
Eu liguei pro Real Visa e pedi pra diminuírem a anuidade, que ia pra 4 x 24 reais. A atendente disse que era impossível. Eu disse:
-Então, cancela!
Ela respondeu:
- Mas senhor, o cartão é um cartão bom demais, etc.
Eu disse:
- Não vejo motivo pra pagar 100 merréis por ano pra pagar minhas contas com um pedaço de plástico.
Ela disse:
- Mas senhor, nosso produto é diferenciado. Não podemos abaixar o valor.
Eu disse: - Então, cancela!
Aí ela disse:
- Espere um minuto, por favor.
Voltou com a boa nova:
- Senhor, podemos deixar pelo valor que está, 4 x 16 reais.
Eu disse:
- Então, cancela!
Ela respondeu:
- Espere um minuto, por favor.
Mais uma vez:
- Senhor, podemos deixar por 3 x 16 reais.
Eu disse:
- Não quero. Cancela.
Ela novamente disse:
- Espere um minuto, por favor... Senhor, podemos deixar então por 2 x 16.
Aí, eu concordei. Mas tive a impressão que poderia sair dessa negociação com o Real Visa me pagando pra usar aquela merda...

CASO 2
A TVA reajustou os preços. Eu disse que não ia pagar aumento nenhum. A atendente respondeu:
- Senhor, infelizmente não podemos fazer nada.
O que que eu fiz? Liguei pra Net e assinei com eles. Liguei pra TVA e disse:
- Cancela!
A atendente robótica disse:
- Senhor, espere um minuto... O senhor não precisa cancelar. Manteremos o preço como está.
Respondi:
- Agora eu não quero, só estão me isentando do aumento porque eu estou cancelando!
Eles ficaram desesperados, porque eu estava cancelando 2 pontos de pacote total e mais a internet de alta velocidade. Abaixo seguem as propostas que eles continuaram fazendo e as minhas respostas:
- Isenção de uma mensalidade.
- Cancela!
- Isenção de duas mensalidades.
- Cancela!
- Manutenção de apenas 1 ponto mais desconto permanente de mensalidade.
- Cancela!
- Manutenção de 1 ponto com pacote reduzido mais desconto permanente.
- Cancela!
- Proposto acima com inclusão de HBO e mais algumas mensalidades reduzidas com internet de alta velocidade.
- Cancela! Cancela! Cancela!
Cancelei, e agora pago mais barato!

CASO 3
Quarta eu fui jantar num restaurante, e esqueci meu celular lá. No dia seguinte, eu liguei pra Vivo e pedi que desligassem o número por segurança, até eu recuperar o aparelho.
A atendente disse, naquela língua do gerúndio odiosa:
- Senhor, estaremos cobrando uma taxa de 24 reais.
Eu me indignei:
- Como é? Eu pago 60 reais pra usar o mês inteiro, e vou pagar 24 reais pra NÃO usar o celular por três dias?
Ela respondeu que não tinha jeito. O que que eu disse?
- ENTÃO, CANCELA!
Aí ela disse:
- Senhor, um minuto que eu vou estar lhe passando pra outro setor.
Atendeu uma outra mulher que disse que eu "poderia estar fazendo o cancelamento sem estar sendo cobrado pelo serviço." Eu respondi que se ela estivesse fazendo isso eu ia estar agradecendo. De qualquer maneira, comprei um celular da Tim (125 minutos por 55 reais) e vou dar um chute nessa Vivo semana que vem. Vai ser divertido ver eles implorarem.

MORAL: Entenderam? Não esqueçam as palavras mágicas: "Então, cancela!"

Uau!


29 de março de 2004.

O fim de semana foi muito legal! Imagem & Ação no sábado, Miguel Falabella e Cláudia Raia no domingo!

Um de Veríssimo


14 de janeiro de 2004.

"Certo dia parei para observar as mulheres e só pude concluir uma coisa: elas não são humanas. São espiãs. Espiãs de Deus, disfarçadas entre nós. Pare para refletir sobre o sexto-sentido. Alguém duvida de que ele exista? E como explicar que ela saiba exatamente qual mulher, entre as presentes, em uma reunião, seja aquela que dá em cima de você? E quando ela antecipa que alguém tem algo contra você, que alguém está ficando doente ou que você quer terminar o relacionamento? E quando ela diz que vai fazer frio e manda você levar um casaco? Rio de Janeiro, 40 graus, você vai pegar um avião pra São Paulo. Só meia-hora de vôo. Ela fala pra você levar um casaco, porque "vai fazer frio". Você não leva. O que acontece? O avião fica preso no tráfego, em terra, por quase duas horas, depois que você já entrou, antes de decolar. O ar condicionado chega a pingar gelo de tanto frio que faz lá dentro! "Leve um sapato extra na mala, querido. Vai que você pisa numa poça...." Se você não levar o "sapato extra", meu amigo, leve dinheiro extra para comprar outro. Pois o seu estará, sem dúvida, molhado... O sexto-sentido não faz sentido! É a comunicação direta com Deus! Assim é muito fácil...
As mulheres são mães! E preparam, literalmente, gente dentro de si. Será que Deus confiaria tamanha responsabilidade a um reles mortal? E não satisfeitas em gerar a vida, elas insistem em ensinar a vivê-la, de forma íntegra, oferecendo amor incondicional e disponibilidade integral.Fala-se em "praga de mãe", "amor de mãe", "coração de mãe"...Tudo isso é meio mágico... Talvez Ele tenha instalado o dispositivo "coração de mãe" nos "anjos da guarda" de Seus filhos (que, aliás, foram criados à Sua imagem e semelhança.).
As mulheres choram. Ou vazam? Ou extravasam? Homens também choram, mas é um choro diferente. As lágrimas das mulheres têm um não sei quê que não quer chorar, um não sei quê de fragilidade, um não sei quê de amor, um não sei quê de tempero divino, que tem um efeito devastador sobre os homens... É choro feminino. É choro de mulher...Já viram como as mulheres conversam com os olhos? Elas conseguem pedir uma a outra para mudar de assunto com apenas um olhar. Elas fazem um comentário sarcástico com outro olhar. E apontam uma terceira pessoa com outro olhar. Quantos tipos de olhar existem? Elas conhecem todos... Parece que freqüentam escolas diferentes das que freqüentam os homens! E é com um desses milhões de olhares que elas enfeitiçam os homens. E-n-f-e-i-t-i-ç-a-m .... E tem mais! No tocante às profissões, por que se concentram nas áreas de Humanas? Para estudar os homens, é claro! Embora algumas disfarcem e estudem Exatas... Nem mesmo Freud se arriscou a adentrar nessa área. Ele, que estudou, como poucos, o comportamento humano, disse que a mulher era "um continente obscuro". Quer evidência maior do que essa? Qualquer um que ama se aproxima de Deus. E com as mulheres também é assim. O amor as leva para perto dEle, já que Ele é o próprio amor. Por isso dizem "estar nas nuvens", quando apaixonadas.
É sabido que as mulheres confundem sexo e amor. E isso seria uma falha, se não obrigasse os homens a uma atitude mais sensível e respeitosa com a própria vida.Pena que eles nunca verão as mulheres-anjos que têm ao lado. Com todo esse amor de mãe, esposa e amiga, elas ainda são mulheres a maior parte do tempo. Mas elas são anjos depois do sexo-amor. É nessa hora que elas se sentem o próprio amor encarnado e voltam a ser anjos. E levitam. Algumas até voam. Mas os homens não sabem disso. E nem poderiam. Porque são tomados por um encantamento que os faz dormir nessa hora.

Luis Fernando Veríssimo

Felicidade de orquídea


8 de janeiro de 2.004.

Existe vida numa relação sem sexo?
Por Ailin Aleixo

Vocês estão juntos há um tempão e se amam. A conta conjunta está no vermelho, a sua prima é amiga da tia dela, vocês compraram uma casa. Com tudo isso, qual o problema de, num domingão, em plena sessão de cinema no sofá, dar mais vontade de ficar deitado juntinho do que de transar? Nenhum, se isso acontecer uma vez ou outra. O problema começa quando só se tem vontade de ficar juntinho. Piora se, depois de várias reprises dessa cena, um dos dois muda de opinião sobre ser tão gostoso assim apenas ficar juntinho. E se torna insustentável na hora em que ela (ou você) se sente um lixo erótico, a versão humana do peixe-boi.
Ela o apóia nas horas complicadas, implica com seus amigos, te pentelha se sente seu bafo de cachaça e não rola a menor tensão sexual entre vocês? Então você não tem mais uma mulher: tem duas mães.

Sentir-se desejado é tão vital quanto vitamina C: um agarrão inesperado, uma sacanagem ao ouvido fazem o dia valer a pena, reluzem o ego. A ausência desses pequenos carinhos e, mais tarde, do ranger da cama, é um tremendo indicador de que tem algo bem errado na relação. O tesão é a demonstração instintiva do quanto queremos aquela pessoa perto, dentro, misturada a nós. Ou do quanto não fazemos questão disso. Já passou da hora de acabar com essa hipocrisia de que, depois de um tempo, o sexo se torna desimportante para os casais. Como assim? Quer dizer que num determinado momento viramos samambaias? Não, mas nos tornamos peritos em negar o óbvio: a relação está, sim, na UTI.
É impossível não ficar abalado quando nosso parceiro e o abajur surtem o mesmo efeito sobre nossa libido, mas é possível ignorarmos os sintomas e continuar “nos dando superbem”. A vaca vai de vez pro brejo quando buscamos em outros corpos os toques, beijos e orgasmos ausentes e tão necessários.
Será que vale a pena viver comendo fora ou menosprezar a própria sexualidade em prol de um relacionamento estável?

SEM SUSTANÇA

Não, não vale. Cedo ou tarde ele deixará de ser estável para ser penosamente estabilizado (e dará cada vez mais trabalho, feito carro consertado em mecânico ruim). Existem, sim, diversos fatores essenciais numa boa relação: cumplicidade, amor, apoio, carinho, mas isso tudo é insuficiente sem tesão. É como biscoito de polvilho: é até gostosinho, mas não mata a fome. É preciso muito mais sustança. E, uma noite, adormecemos angustiados ao lado da pessoa que escolhemos para tornar a vida melhor, mais clara. Nos damos conta de que viramos amiguinhos. Somos tomados por uma insatisfação que nada consegue sanar: nos sentimos incompletos por vivermos numa farsa particular. E entristecemos, porque é mesmo doloroso notar que não bastam amigos, filhos, móveis e lembranças para sermos felizes ao lado de alguém: nenhum passado em comum salva um presente inegavelmente divergente. Não basta a vontade de ficar juntinhos no sofá: tem que existir desejo. E, se ele estiver mesmo morto, o melhor a fazer (pelos dois) é aceitar que você a amará por muito tempo – um amor fraternal e cuidadoso –, mas que deve vagar seu lugar na cama. Se dá pra ser feliz numa relação sem sexo? Claro que dá. Se você for uma orquídea.

A danada da estréia


8 de janeiro de 2.004.

A primeira transa com um novo affair pode ser tão ruim quanto perder a virgindade
Por Kika Salvi

Quando perdi a virgindade, achei que estava sendo rasgada ao meio. Aquilo não teve nenhuma graça. Não vi estrelas, não suspirei de encantamento nem senti a comunhão apaixonada de dois corpos se fundindo. Me senti f..., isso sim. E no mau sentido, no pior de todos: achei uma baita sacanagem a natureza reservar aquele susto a uma menina, aquela sensação de que não haveria espaço suficiente para o corpo invasivo sem que sua receptora jorrasse sangue e gritos de aflição. Bem, de fato houve sangue, e uma aflição silenciosa disfarçada por um contentamento fingido, preocupada em não ferir não somente os sentimentos do meu caro abre-alas, mas também minha própria fantasia infantil e romântica de que experimentaria o êxtase do glorioso rito de passagem à vida adulta. A única coisa boa da primeira vez é que você se livra dela tão logo chegue à segunda, e vai aos poucos se inteirando da engrenagem toda do prazer. Não é mesmo? Não, não é. Porque o raio da primeira vez vai assombrar a nossa vida pelo resto da existência (ou até que se produzam hormônios sexuais em quantidade suficiente para as glândulas secretarem os líquidos da sociabilidade conjugal). O que no início era dor agora se encabula, e essa é a segunda grande peça que a natureza nos pregou: a menos que se tenha a sorte (ou o azar, vai saber) de encontrar o grande amor em tenra idade, a primeira vez com alguém será sempre tão desventurada quanto aquela que nos descabaçou. E como a vida saudável prevê uma certa experimentação sexual, o tormento da avant-première acaba sendo um tema recorrente vida afora.

DA ALEGORIA À ALEGRIA


A primeira vez com alguém é quase sempre temerosa. Porque tem o lance da nudez, do desconhecimento da sensibilidade do compadre, das predileções ainda ocultas. É quase um campo minado, em que os prudentes tateiam sem muita categoria para não explodir minas mortais (ou você acha que um cara que curte uma retaguarda vai se impondo com maestria nos fundilhos da garota? Isso dá cartão vermelho...). A cautela revela interesse em descobrir o que o outro gosta. Quem vai direto ao ponto ou com muita sede ao pote, ou está inseguro e quer mostrar serviço ou está andando para as sensações que propicia à sua presa. Eu, por exemplo (não sou paga pra ilustrar com caso próprio, mas é sempre bom lembrar que a colunista também se intimida na primeira): tenho estrias na barriga depois da maternidade. Tudo o que há de bom em minha extensão anatômica fica momentaneamente suprimido pelo receio de que as tais estrias saltem aos olhos do meu novo namorado. E, pelamordedeus, quem consegue gozar tentando ocultar imperfeições? Eu, não. Mas pra isso tem etiqueta. E a etiqueta diz, com letras garrafais e em negrito, que um homem jamais deve tecer comentários detalhados sobre o corpo da bem-vinda. Elogios, sim, mas comentários (sobretudo os embasados), não. Adjetivos vagos e genéricos não fazem mal algum, muito pelo contrário. “Gostosa”, “deliciosa”, “cheirosa”, “linda”, “macia”, todos são permitidos e funcionam feito bálsamo nas travas da mocinha. Já chamá-la de “bunduda”, “peituda”, “coxuda” ou “peluda” (ou qualquer outra palavra que termine em “uda”), nada disso surtirá efeito relaxante para a entrega. Principalmente se forem utilizadas no aumentativo. E nisso está a sabedoria: aposte no genérico, seja gentil e minta quando for preciso para a pobrezinha se soltar e parar de reinventar o trauma do primeiro arrombamento.

Novo ano


7 de janeiro de 2.004.

Cheguei agora em 2.004... Por aqui, é claro!
O Natal foi a dois, meu amor e eu. Às zero hora de 24 para 25 estávamos numa cantina italiana, Bexiga, esperando um filé ao molho madeira para comer. Muito bom! Comemos em casa, contudo.
Dia 26, estrada. Castello Branco rumo a Marília. Boa rodovia! Nunca havia andado por lá a não ser até Alphaville.
Lá, mansão. Casa perfeita. Tudo. Planta, hidráulica, elétrica, decoração... Tipo casa modelo, daquelas em que quando você entra tem a impressão de que ninguém mora lá (ainda).
O clima estava bom. Os dias foram bons. Até tentar pescar eu fui. Aprendi a preparar e comi peixes que não pesquei....
Sem assunto. Era só para inaugurar o ano mesmo...

Apenas uma lembrança


18 de dezembro de 2003.

Ouvi a música ontem, depois de muito, muito tempo... Rosana. Você foi um caso mal resolvido e mal vivido. Apaixonei-me. Você foi consciente. Só isso. Eu é que estava louco. Eu é que não estava medindo conseqüências. Mas queria você.
Anos se passaram e um dia vi seu rosto na tv. Gelou-me dos pés à cabeça. Que saudades! Que vontade de você...

O Que é Que Há
Fábio Jr.

O que é que há?
O que é que está se passando
com essa cabeça?
O que é que há?
O que é que está me faltando
Pra que eu te conheça melhor?
Pra que eu te receba sem choque?
Pra que eu te perceba
No toque das mãos
No seu coração?
O que é que há?
Por que é que há tanto tempo
você não procura meu ombro?
Por que será?
Por que será que este fogo
Não queima o que tem pra queimar?
Que a gente não ama
O que tem pra se amar?
Que o sol tá se pondo
E a gente não larga
Esta angústia do olhar?
Telefona
Não deixa que eu fuja
Me ocupa os espaços vazios
Me arranca desta ansiedade
Me acolhe, me acalma
em teus braços macios
O que é que há?
O que é que "tá" se passando
Com a minha cabeça?
O que é que há?
Telefona
Não deixa que eu fuja
Me ocupa os espaços vazios
Me arranca desta ansiedade
Me acolhe, me acalma em teus braços macios, macios
O que é que há?
O que é que há?

Minha história sobre o mundo ser pequeno


9 de dezembro de 2003.

Muita gente diz: "Como esse mundo é pequeno..." Hoje, descendo mais uma vez a Consolação vinha ouvindo dance music. Lembrei-me da Renata, minha história sobre o mundo ser pequeno.
Estava só em São Paulo e meu irmão ainda era solteiro. Saíamos vez em quando para paquerar. Já na época, pelos lugares onde íamos, sentia-me deslocado por ter mais idade. Resolvemos ir, certa noite, ao Resumo da Ópera que hoje já não mais existe. Shopping Eldorado. Nem eu nem ele, meu irmão, dançamos nada. Até hoje.
Lá pelo meio da madrugada, de olho na pista, surgiu um espetáculo de mulher. Linda, elegante, sorriso largo, cabelos soltos, dançando e não só dançando, mas dando o show. Parecia não estar acompanhada. Meus olhos fixaram-se rapidamente e cutuquei com a mesma velocidade meu irmão. Ficamos ali, parados, vidrados. Não me lembro de como e nem de quando nos dispersamos. Talvez somente quando ela saiu da pista e desapareceu em meio à multidão.
A noite continuou a passar. Lá pelas três da manhã resolvemos ir embora. Na fila do caixa, surpresa: ela à nossa frente. "Vamos seguir!", sugeriu meu irmão. O estacionamento já estava vazio. Os carros estavam distantes e lembro-me de dois caras que a abordaram por ali. Ela não deu atenção. Saímos. Rebouças na maior loucura. Ela pisava fundo e eu atrás, até parar no meio do cruzamento com a Henrique Schaumann. Meu irmão já ia falar algo e não deu tempo. Nova disparada até uma rua menor. Pela janela do carro meu irmão sugeriu: "Vocês parecem estar perdidas..." Era ela e mais uma garota no carro. Quando falaram que realmente estavam e, perguntadas sobre que destino queriam, propusemos a guiá-las até lá. Alguma rua da Vila Mariana, o que para nós era fácil por ser também nosso caminho. Quando finalmente chegamos, emparelhamos os carros e meu irmão começou a conversa. Logo soube que estava perdida por ser do Rio de Janeiro. A conversa caminhava e ouvi, lá do meu canto, que trabalhava nas Lojas Americanas, setor de compras de perfumaria. Não pude conter-me. Era minha concorrente direta, profissionalmente falando. Saí do carro e continuamos a conversa por um pouco... Coincidência. Mesmo universo, mesmos fornecedores, os dois principais do mercado. Mundo pequeno.
O tempo passou. Certa manhã, não me lembro se de sol ou chuva, o chefe me chamou à sua sala. "Quer dizer que você anda por aí, nas noites, paquerando as menininhas..." Nada entendi a princípio até que ele mesmo me explicasse. Contou toda a história sem mencionar nomes e depois lançou-me a pergunta: "Você sabe de quem estou falando?" "Renata", respondi. "O senhor a conhece?" "Estou entrevistando-a para trabalhar aqui conosco..." Tanta gente e o cara entrevista justo ela? Coincidência. Mundo pequeno.
Alguns dias mais vieram. Cabeça baixa, concentrado em meus afazeres, fui surpreendido pelo chefe: "Aí, Júnior, veja quem está aqui!" Era ela: Renata. Sentou-se à minha frente e trocamos algumas palavras. Falou sobre vir para São Paulo, da proposta a ser estudada. E eu estava prestes a sair daquela empresa...
Mudei cerca de um mês depois. Fui para o mesmo departamento no qual havia me especializado: perfumaria. Passados alguns dias, Márcia, minha amiga, veio dizer-me que estava preparando uma assistente para mim, muito boa, que viria das Lojas Americanas...
Não preciso dizer mais nada... O mundo é pequeno mesmo.

A gente baba por estes pés


8 de dezembro de 2003.
Revista Playboy

Você disfarça, finge que procura algo no chão e... dá uma secada no pé matador da gata sentada ao seu lado. relaxe, você é normal. No fundo, somos todos podólatras.
Por Geraldo Mayrink

Na Europa Central muitos acreditam nesta receita milenar: unte o dedão do pé com uma mistura de óleo vegetal e cantárida - um besourinho com poderes afrodisíacos - e a rigidez do pênis está garantida.


- O psicólogo americano Martin Rudovsky teorizou: "Descobrir o pé de uma pessoa do outro sexo simboliza a possessão sexual".
- Há uma ligação forte entre o pé e a castração. Prisioneiro da ditadira militar brasileira, o falecido filósofo e escritor paulista Luís Roberto Salinas Fortes sofreu tantas torturas na prisão que acabou perdendo o dedão de um dos pés. Professor na USP, especialista na obra de Jean-Jacques Rousseau, Salinas era bonito e brilhante e fazia grande sucesso com as mulheres. Solto e amputado, ele achava que a tortura foi o que menos o abalou. Ao perder o dedão, desenvolveu a sensação de que teria se tornado impotente.
- As sandálias - mesmo as mais humildes, de plástico - são populares não só por serem baratas mas também por terem um forte apelo erótico para as usuárias. Pois as desnudam sem na verdade despí-las. E são socialmente aceitáveis em qualquer ambiente.

A adoração aos pés não é uma simples manifestação de fetichismo. Ela é desejo de verdade, que surge entre pessoas normais, como nós.


- Ao cruzar as pernas, elevando um dos sapatos, a mulher produz uma ilusão de ótica que torna seu pé mais elegante, riscando no espaço uma fina linha que ele não teria no chão, onde ficaria aplastrado.
- Um belo pé pode amenizar até três quartos da feiúra de uma mulher e causar paixões abrasadoras, segundo se diz entre os homens chineses.
- Outra da China: fazer qualquer menção aos pés das chinesas é considerado ofensa pelo marido. Seria como comentar, entre nós, sobre os peitos ou a bunda da dona-da-casa.
- Macho mitológico, sátiro de tantas amantes, Casanova escreveu em suas memórias que todos aqueles que se interessam de verdade por alguma mulher começam a amá-la exatamente pelos pés.

"Uma obra prima de acabamento", dizia Leonardo da Vinci sobre os pés

- A língua alemã tem uma palavra certa para descrever a situação erótica entre duas pessoas cujos pés se roçam debaixo da mesa: flüssen. Quer dizer exatamente isto: um contato sexual e carinhoso específico. Sapato tocando sapato, pé contra pé. "Tá vendo aquela gata? Acabei de flussar com ela!!"
- No The Golden Tongue Sallon, em Nova York, informa-se que ali se presta serviços "a damas liberadas através de homens belos e leais especialistas na aplicação da língua para fins sexuais, inclusive sucção de dedos dos pés".
- Foot's Pleasure Palace, no bairro de Kensington, em Londres, onde as profissionais, "todas com pés alvos e delgados, com dedos longos e flexíveis", segundo anúncios publicados nos jornais, estão lá para fazer o que se espera delas - pisar nos seus clientes. E depois terem seus pés sugados, com os homens agachados diante delas.
- A ciência não consegue explicar por que a paixão por pés é quase exclusivamente masculina. As mulheres não têm interesse nos pés dos homens. O espetáculo de jogadores de futebol descalçando as chuteiras não desperta qualquer emoção nelas. Já imaginar nossas estrelas do vôlei tirando os tênis, as meias, massageando os pezinhos... Claudia Schiffer calça e mostra em comerciais seus pisantes número 42.
- Antigos textos falam de chineses apaixonados que marcavam os pés de suas amadas com dentadas. Elas banhavam os pés numa bacia de chá para que seus amantes sorvessem o líquido como um filtro de amor. Eles copulavam com os pés das mulheres. Nessa hora, elas cantavam e diziam palavras indecentes, introduzindo os dedões dos pés no ânus deles. E eles gostavam.
- O pé é o símbolo fálico mais agressivo da anatomia humana - daí a expressão "tripé" para caracterizar os cavalheiros mais bem-dotados. Em eslavo o pênis se chama trétja noga, ou "terceiro pé".
- Os pedicuros sabem e fazem de conta que não vêem o que está se passando. Mas alguma coisa acontece no coração e na cabeça das suas clientes. As freguesas até sentem dor às vezes, mas passam pelo que acham ser um sacrifício porque estão dando um pouco de conforto e beleza aos seus pés. Fingem que estão lendo revista ou cochilando enquanto recebem massagem. O que se passa na cabeça delas nesses momentos, de olhos fechados, descalças e com as pernas estendidas no colo daqueles homens, elas nunca vão querer contar a você.
- Nada é tão humano como o pé, dizem os cientistas da podogênese. Talvez por isso que ele seja tão desejável. Todos os bípedes os possuem, mas cada um é especial e exclusivo. Todos os órgãos - mãos, cérebro, coração - têm correspondente nos outros animais. Mas nenhum deles tem um pé dotado de um dedão que avança, é do mesmo tamanho do segundo dedo e forma uma espécie de escada harmoniosa até o dedinho.

"Aquelas mulheronas, aqueles pés suados..." - suspirou Henfil em mais de um comentário.

- Com 52 ossos e uma infinidade de terminais nervosos, o pé é um dos órgãos táteis mais sensíveis do corpo.
- As cortes russas tinham especialistas em lamber pés reais. As princesinhas deitavam-se no sofá e colocavam os pés em cima de um banquinho. Eles tiravam as botas e meias, massageavam e lambiam seus pés. A czarina Catarina, a Grande usava até seis sugadores de uma só vez. E, contam os cronistas, costumava ter vários orgasmos nessas sessões.
- Um anúncio recente avisa: há sandálias em lojas exclusivas de Nova York, de couro e cravejadas de brilhantes, que custam 1 milhão de dólares. Faça as contas: são 500 mil dólares por pé, 100 mil dólares para cada dedinho.

Muito bom de sentir...


8 de dezembro de 2003.

O clima estava muito bom. Nem frio nem quente, uma brisa como há muito eu não sentia. O céu estava meio azul claro meio escuro e as nuvens faziam desenhos maravilhosos. Eu estava descendo a Consolação, os dois vidros do carro abertos, ouvindo “It must have been love”. A sensação foi de liberdade, felicidade, descompromisso. Muito bom de sentir... Como o clima. Com o coração amando tudo fica melhor ainda... Isso não foi hoje. Foi sexta-feira ou sábado. Mas eu tinha que escrever.

Preconceitos


2 de dezembro de 2003.

Conversa interessante. É inexplicável porque entrei onde entrei. Fui almoçar onde havia tempo não ia. Deu uma louca, uma vontade de comer filet mignon mesmo pagando um pouco caro. Pois é, encontrei o chefe. Após vários assuntos, homossexualismo.
Eu odiava a raça, como dizia e às vezes ainda digo. Não me lembro ao certo se foi num filme ou novela, vi retratado o amor. Um sentimento muito bonito entre pessoas do mesmo sexo. Entendi que podem se amar. Aprendi a respeitar. O que ouvi foi mais profundo. História de um amigo que tinha somente irmãs. Descobriu-se um dia homossexual. Sofria a pressão de uma família tradicional japonesa. Casamento, necessidade de dar continuidade ao nome. Foi morar no Japão. Lá pode viver mais livremente sua opção sexual. Voltou e viu a morte do pai. Quis contar à mãe sobre sua vida, porém, após a sua morte, arrependeu-se de ter tentado. Ela nunca entederia. Poderia ter sido poupada. Vida livre das pressões agora? Não. Sobrinhos sem qualquer educação sexual. E ele não poderia ser exemplo. Decidiu voltar ao Japão. Chorou.Toda esta história foi um dia confessada em meio a muitas lágrimas. O ouvinte também passou a enxergar o homossexualismo com mais respeito. Não conseguia, porém, tratar como antigamente o amigo numa roda de homens. Nunca mais dirigiu-lhe a frase "Ô, seu veado!" naquele tom de brincadeira. Até ser chamado à atenção: "Trate-me normalmente, como sempre foi. Não vou me sentir ofendido."

É forte. Coisa para se pensar...

Infância


Data: não sei quando escrevi esse texto...

Eu não me lembro da minha infância. Um ou alguns momentos vez em quando. Detalhes particulares de algumas pessoas que passaram por meu caminho. Kátia é uma das lembranças de quando era ainda bem pequeno. Minha mãe, quando me dizia que íamos à casa da prima, via logo um sorriso longo em minha face. Meu coração pequeno acelerava-se ainda mais dentro do peito. Brincávamos muito. Lembro-me de um grande elefante de pelúcia. O avô paterno está sempre presente a essas memórias, mas não há motivo aparente para o detalhe. Talvez uma fotografia, que ainda hoje existe, que mostra-nos juntos em algum lugar.
O avô é lembrado com carinho. Foi-se no ano de 1.979, no primeiro dia do mês de outubro. Eu, então com treze anos de idade, ouvi a notícia chegar quando tocou logo cedo o telefone. Provavelmente foi meu pai quem ligara à minha avó materna. Ouvi a conversa escondido, de dentro do quarto onde dormira, com a porta semi-aberta. As palavras da conversa foram breves, muito breves. Voltei à cama, um sentimento de vazio no peito. Meus irmãos ainda dormiam. E eu chorei. Foi, dentro de minha memória, a primeira morte de que tive notícia. Nada vi. Os dias passaram, poucos, e voltei a São Paulo, onde morava. A luz da sala era fraca para a noite. Imperava um silêncio no ar, pesado. Malas foram colocadas nos primeiros cômodos da casa, meus irmãos foram talvez dormir. A mãe, preparar algo para comermos. E o pai estava tão só que nem a minha presença sentia ou observava. Eram muitas correspondências. Eu, menino, pensei ser por tantos dias longe de casa. Não eram. Meu pai começou a abrí-las e logo a derramar lágrimas infindáveis. Tentei ler algumas das mensagens. Condolências. Meus olhos embaçaram-se acompanhando os de meu pai, mas antes que me rolassem as lágrimas pela face saí rapidamente para alguma solidão. E chorei. Desta vez não pela morte do meu avô, mas pelo choro de meu pai que até então me era desconhecido. Nunca mais também o vi.
Após o dia de outubro acabaram-se também os encontros de Natal. Eram muito bons, ao menos para as crianças. Todos ganhávamos presentes de acordo com nossos pedidos. O Papai Noel era o tio mais velho, Eduardo, embora nunca tenha trajado-se como tal. E o barulho após a entrega dos brinquedos é ainda inexplicável por palavras. Bonecas que falavam, mini-eletrodomésticos, carrinhos com sirene e motores ensurdecedores. As crianças desencontravam-se nos interesses. Cada qual particularizava-se a princípio, alguns ganhavam o interesse de outros num segundo momento. Os adultos falavam alto e gargalhavam em alguns assuntos. Um dos tios falava sem parar a quem quisesse ouvi-lo. Eu gostava de passar por alguns desses instantes. Às vezes minha atenção era até maior do que a de outros ouvintes. Fazia perguntas, interessava-me por política e movimentos partidários. Pouco na verdade entendia, mas tentava. E o encontro terminava sempre feliz.
O convívio familiar não era bem dividido. Vivi mais junto ao lado materno da família. Da avó lembro-me do tempero da comida. Indescritível para a criança, não tão atraente ao adulto. Passeios pela feira, feijão preto. O avô levava-me com meus irmãos a lugares pouco mais memoráveis. Ao campo do colégio para empinarmos papagaio, pipa, quadrado... Quantos nomes para a mesma coisa de papel de seda!... À fábrica de queijos e doces para compra de sobremesas. À piscina do clube. Ao sítio da tia Conseta. Lá eu gostava das vacas, galinhas, hora do café. Dentre a variedade da mesa, bolo de fubá. Íamos também a uma cidade vizinha, Muriaé, onde havia aeroporto e pequenos aviões. Ao Morro do Imperador. Na lembrança este passeio relaciona-se a puré de batata. Coincidência de almoços nos dias do passeio, talvez. Mas a maior probabilidade é a da semelhança de nomes: “puré” com Im”pera”dor. Semelhança não necessariamente de nomes, sim de pronúncias: puré para mim sempre foi “pirê”... É, coisas de criança criativa.