segunda-feira, maio 28, 2007

Nair


5 de janeiro de 2006.

Antes de qualquer outra coisa é preciso dizer: o que pode nos parecer pouco, pode ser muito para uma outra pessoa. O inverso também é verdadeiro.
Trabalhei muitos anos como comprador de perfumaria e em grandes empresas. Um dos meus fornecedores, na ocasião, era a Perfumaria Rastro e quem me atendia era a Nair.
Os produtos, antigos de mercado, pareciam percorrer uma curva doente, rumo à morte. Meu conceito sobre a Rastro é que tinha como consumidores a geração da minha mãe ou quase certamente mais do que isto, a da minha avó. Os produtos não se renovavam e muito menos existia qualquer campanha publicitária que tentasse reavivar a marca. Talvez a indústria nem tivesse "bala" para qualquer das duas coisas. O final da história só poderia ser mesmo a morte.
A Nair vinha periodicamente fechar algum pedido comigo. E eu, acompanhando o histórico de cada item no sistema, comprava. Na verdade eu praticamente apenas repunha o que havia vendido. Eram pedidos pequenos. A Nair reclamava e contestava. Dizia que a venda era pequena porque eu não tinha produtos no ponto de venda. E era assim todo mês.
Um dia eu olhei bem nos olhos da Nair e lhe disse:
- Faça o pedido. O que você acha que eu deveria comprar?
Depois de agradecer a oportunidade, colocou ali, naquele formulário, os números que julgava bons e disse que eu não me arrependeria. As vendas iriam crescer.
No encontro seguinte verifiquei que de fato houvera um crescimento. Dei a ela o formulário mais uma vez, e assim continuei fazendo.
No final daquele ano aquela minha cara senhora chegou com um presente. Explicou que não era uma lembrança da Rastro e sim dela, pessoal, e agradeceu. Eu a ajudara muito naquele ano. Eu dera a ela uma oportunidade e ela conseguira bons resultados.
Eu nunca mais esqueci desta história. O que era tão pouco para mim, foi muito para a Nair. E eu nem imaginava que tamanho tinha aquele gesto para ela, o que representava.
Quantas vezes não sei dimensionar minhas atitudes e não sei o valor que tenho para as pessoas... Quantas vezes as pessoas não sabem também o valor que têm para mim... Precisamos falar.
...
Ontem, depois de muitos anos, reencontrei a Nair. Conversamos. Foi bom revê-la.